Jack Bruce (1943-2014)

Em por Djacir Dantas
Atualizado em 7 de novembro às 18:07

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Há duas semanas, morreu Jack Bruce. As matérias nos jornais o citaram como um grande nome do rock e do blues. Ele se considerava um jazzista. Nenhuma contradição. Jack Bruce transitou com desembaraço por todas essas sendas.
Nascido na Escócia, em 1943, John Symon Asher Bruce começou seus estudos na adolescência, no Royal Scottish Academy of Music, recebendo aulas de violoncelo. Mas seu pai era um amante de jazz, e logo o aluno estava misturando música clássica e jazz, para desagrado dos seus rígidos mestres. A imposição foi imperativa. Ou parava com as digressões jazzísticas ou deixava o conservatório. O aluno não hesitou. Escolheu a liberdade de trilhar livremente os caminhos musicais que a vida lhe trouxesse. Sua educação musical formal durou apenas três meses.
Em 1962, Jack Bruce estava em Londres, onde entrou em contactos com músicos que cultivavam o blues. Trocou com Alexis Korner, um dos pioneiros, onde Charlie Watts também ensaiou seus primeiros passos, e na Graham Bond Organisation, onde conheceu e teve vários desentendimentos com o baterista Ginger Baker.
Seu próximo passo foi o John Mayall’s Bluesbrakers, onde só ficou por poucas semanas, mas o suficiente para impressionar o guitarrista. Na sua biografia, Clapton escreveu: “Musicalmente, ele foi o mais vigoroso baixista com quem já toquei. Ele lidava com o baixo quase como se fosse o instrumento líder, mas não ao ponto de ofuscar os demais e o sua noção de tempo era fenomenal. Tudo isso se refletia na sua personalidade, impaciente e perceptiva. Fico feliz em dizer que a admiração era mútua, e nós nos entendemos muito bem, antecipando o que o futuro nos traria.”
E o futuro não tardou a se apresentar, na pessoa de Ginger Baker. O baterista convidou Eric Clapton para formarem um grupo. Clapton pensou de imediato em um trio, composto por um guitarrista (ele próprio), um baterista (Ginger Baker) e um baixista. Seu modelo era um dos seus ídolos, Buddy Guy, que comandava um trio com essa formação. E Eric já tinha o nome do baixista na ponta da língua. Jack Bruce. Para desespero de Ginger Baker.
Baker não aceitou de imediato. Aguardou algumas semanas, mas vendo que não havia outra forma de contar com Eric Clapton, terminou por concordar. O primeiro dia de ensaio parecia confirmar todos os receios do baterista, pois em poucos minutos de conversa ele e Bruce já estavam às turras. Mas resolveram tocar e aí a música começou a falar mais alto, aparando as arestas entre os dois. Era o nascimento do Cream, cujo nome sugeria, sem qualquer traço de modéstia, que ali estava o creme do blues-rock inglês. E assim foram tratados pela imprensa inglêsa. Foi a primeira banda a ser chamada de supergrupo.
O Cream não durou muito, entretanto. Pouco mais de dois anos, tempo suficiente para se tornarem lendários, embora alguns críticos achem que a importância do grupo foi superdimensionada. E o motivo da dissolução não foi o choque de egos, comum entre componentes de supergrupos. Foi, segundo Eric Clapton, o próprio sucesso do Cream, que os levou a uma agenda tal que dava pouco espaço para a criação. Por fim, o cansaço prevaleceu e, de comum acordo, os três decidiram pelo fim do grupo. Para surpresa dos fãs e da imprensa, já que estavam era plenamente bem sucedidos. O Cream vendeu mais de 35.000.000 de discos em dois anos e o LP Wheels of Fire ganhou o primeiro disco de platina da história fonográfica. Em 2005, os três se reuniram para uma rápida excursão comemorativa. Abaixo, um trecho do show:


O Cream catapultou de vez a carreira de Eric Clapton. Jack Bruce e Ginger Baker também tiveram carreiras vitoriosas, mas nunca mais alcançaram um sucesso tão amplo quanto no tempo do Cream. Mais curioso, porque naqueles finais dos anos 1960, Eric Clapton quase não cantava. O vocalista da banda era Jack Bruce, que foi também o compositor das músicas mais bem sucedidas do Cream, como Sunshine of your Love e White Room. São as trapaças da sorte, como diz a letra de Cacaso.

Aqui, o Cream e seu maior sucesso, Sunshine of your love, em pleno esplendor, na década de 1960:


Jack Bruce continou o mesmo baixista criativo e vigoroso do tempo de Cream. E seguiu participando de grupos que incluíam pessoas de formação tão diversa como Carla Bley, Tony Williams e John Medeski, para citar alguns jazzistas, e Frank Zappa, Mick Taylor, Phil Manzanera e Billy Cobham, de raízes roqueiras.
Jack Bruce foi entronizado no Hall da Fama, com o Cream, e recebeu vários prêmios especiais. Seu corpo foi cremado em Londres. Os antigos companheiros do Cream, Eric Clapton e Ginger Baker, estiveram presentes. Na cerimônia de cremação, eles e outros artistas, como Phil Manzanera e Gary Brooker, tocaram as músicas Morning has broken, Strawberry Fields Forever e Theme from an Immaginary Western, esta última uma composição de Jack Bruce, em uma derradeira homenagem ao amigo.

Capa em destaque – Cream – Good-bye (1969)

O álbum de despedida do Cream foi lançado após a separação do grupo. O disco contém 6 músicas, das quais só as do “lado B” eram inéditas. Mas entre estas figura Badge, uma parceria de Eric Clapton e George Harrison, que se tornaria um dos números mais frequentes na carreira solo de Clapton. Para marcar a despedida, o trio foi vestido com um terno brilhoso, chapéu e bengala, um figurino tradicional do show-business, em pose de agradecimento, sinalizando o último ato de um trio que marcou indelevelmente a história do rock.

goodbye cream


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